


Laços quebrados: uma história de traição
A névoa noturna envolvia ominosamente o reino de Morsovia, pairando sobre a majestosa mansão da família Shadowbrook em Solaria. O vento sussurrava através das árvores escuras, agitando galhos retorcidos que ecoavam as lamentações de um passado marcado pela inveja e ressentimento.
Cada brisa fria trazia consigo um arrepio que percorria a espinha de Eveline, enquanto ela se preparava para mais uma ousada incursão noturna. Seu coração nobre ansiava por aliviar o sofrimento dos menos afortunados, enchendo uma bolsa com suprimentos essenciais, cada batida do relógio ecoando como uma contagem regressiva, fazendo seu pelo se arrepiar de medo de ser pega.
No entanto, o encontro angustiante com seu pai na noite anterior ainda ecoava em sua mente, preenchendo o silêncio ao seu redor com uma tensão palpável, cada pequeno ruído parecendo um sussurro ameaçador. Então, uma voz familiar a assustou das sombras.
"O que você está fazendo aí? Planejando mais uma de suas escapadas ousadas?" sua irmã Astrid permaneceu imóvel com uma maçã na mão.
Os olhos de Eveline se arregalaram de alarme, sua mão trêmula alcançando seu coração acelerado. "Não me assuste assim, Astrid. Pensei que fosse o papai," murmurou, tentando controlar sua respiração acelerada.
Astrid soltou uma risada mordaz enquanto se afastava em direção à sala de estar. "Talvez da próxima vez você não tenha tanta sorte."
Na ponta dos pés, Eveline tentou passar pela sala de estar sem atrair a atenção de seu pai, mas algo a fez congelar. Ela ouviu uma das empregadas chamar apressadamente seu pai, informando-o que um mensageiro da coroa o aguardava no escritório para uma reunião urgente. Aric correu para o escritório, enquanto Eveline instintivamente espiava pela fresta da porta. Ela testemunhou seu pai tremer e levar as mãos à testa. Seu nervosismo preenchia a sala, envolvendo-a em uma atmosfera tensa carregada de mistério.
Aric tentou ser o mais diplomático possível, mas o homem não se importava, apenas sinalizou para ele se sentar.
"Estou aqui em nome do Rei Roderick Blackwood," Aric assentiu. "Você sabe que vivemos por regras e costumes, e é hora de cumprir sua parte."
Nesse ponto, Eveline engoliu em seco. Ela sabia que se um mensageiro do Rei estava em sua casa, era para tratar de assuntos da coroa. Ela precisava descobrir do que se tratava aquela visita.
"Sim, por favor, diga-me como posso servir ao meu rei!"
"Sabemos que sua filha mais velha, Astrid, ainda não tem um companheiro, e você, de acordo com o título que recebeu, tem uma dívida com o rei."
"Sim, eu sei."
"De acordo com as regras do Reino, o rei deseja que sua filha seja a esposa do príncipe."
Aric suava profusamente. Ele sabia que, de acordo com as regras do Reino, era impossível recusar um pedido do rei. O não cumprimento resultaria na morte de toda sua família. Ele não podia arriscar. Eveline ficou chocada com o que ouviu, mas suspirou aliviada por não ser ela a negociada ali. Ela sabia que talvez não conseguisse fingir no meio da realeza, pois era um espírito livre e odiava o regime opressor do Rei Roderick. Não era para ela. Agradeceu à deusa da lua por lhe conceder um companheiro. Sua meia-irmã Astrid sempre foi a pessoa perfeita para estar no meio da nobreza. Eveline respirou fundo e saiu, deixando o assunto para depois.
Astrid é uma jovem de olhos intensos e cabelos tão escuros quanto a noite. Ela está sempre perdida em seus pensamentos sombrios, olhando para a luz fragmentada da lua que ilumina seu rosto cheio de tristeza.
Desde criança, Astrid carregava um sentimento de inveja em relação à sua meia-irmã mais nova, Eveline. Ela se sentia deixada de lado, como uma sombra esquecida no passado, enquanto a vida parecia sempre favorecer Eveline com uma sorte invejável. Os olhos de seu pai brilhavam com ternura e amor sempre que se voltavam para Eveline, e esse sentimento de desigualdade consumia Astrid.
Perdida em seus pensamentos, Astrid ouviu passos se aproximando lentamente. Seu pai apareceu diante dela, segurando seus ombros firmemente.
"Filha, você está aí? Preciso falar com você," disse ele, com a voz cheia de preocupação.
Astrid se virou para ele, encontrando seu olhar. "Pode falar," respondeu curiosa.
Seu pai respirou fundo e contou sobre a visita que recebeu e do que se tratava. Astrid sentiu a indignação crescer dentro dela, um sentimento de profunda injustiça.
"Papai, por que a Eveline pode fazer qualquer coisa, inclusive decidir com quem se casar?" perguntou, com a voz cheia de frustração.
Seu pai suspirou, procurando as palavras certas. "Você sabe que ela é sua irmã mais nova, os costumes são muito claros. Você é minha primogênita, Astrid, é você quem precisa cumprir nosso legado, pois minha família tem uma dívida com o rei."
Infeliz, Astrid deixou sua tristeza transparecer no rosto. "Isso é injusto! Eveline sempre consegue tudo o que quer, faz o que bem entende, enquanto eu sou forçada a me casar com um príncipe inútil," desabafou.
A tristeza deu lugar a uma determinação feroz nos olhos de Astrid. Ela correu escada acima. "Não vou permitir que Eveline faça o que quiser. Ela vai ter o que merece," sorriu com as possibilidades.
Na manhã seguinte, Eveline foi acordada por uma das empregadas. O sol já estava alto no céu, muito além do horário em que ela costumava acordar. Ela havia chegado tarde na noite anterior. Enquanto isso, Astrid já havia saído cedo, indo para o Monte Astoria, onde Eveline costumava se encontrar com seu noivo.
Astrid se aproximou de Caleb, olhando-o nos olhos. "Oi, eu precisava falar com você," sua voz cheia de seriedade.
Caleb hesitou. "Já disse que não podemos nos encontrar. Isso pode atrair atenção indesejada para nós," ele avisou, preocupado.
Astrid não se importou. "Não quero ouvir isso. Decidi contar toda a verdade sobre minha irmã. Você é um homem íntegro, não pode ser enganado assim," disse ela, determinada.
Caleb franziu a testa, confuso. "Do que você está falando?" ele perguntou.
Astrid respirou fundo antes de revelar o que tinha vindo dizer. "Minha irmã está te traindo com outros homens. Quase todas as noites, ela sai escondida da casa do nosso pai e volta tarde, depois de se deitar com outros," disse ela.
Caleb ficou paralisado, a dúvida correndo por suas veias com um arrepio frio, suas duas naturezas conflitantes, cada uma clamando por atenção.
"Não pode ser verdade, eu não acredito," murmurou Caleb, uma raiva primitiva inflamando em seu âmago, uma tempestade selvagem clamando por liberdade dentro dele, mas ele sabia que precisava se acalmar.
Astrid se ofendeu e foi embora, deixando Caleb perdido em pensamentos, a semente da dúvida já plantada.
Determinado a verificar a verdade das acusações, mesmo estando noivo de Eveline, Caleb decidiu observar e esperar. Na segunda noite de vigília, ele pegou Eveline saindo escondida. Suas explicações não foram suficientes para convencê-lo, e ele tomou uma decisão que mudaria sua vida.
"Não vou ficar com uma mulher tão desonesta como você. Eu te rejeito como minha companheira. A partir de agora, não venha me procurar!" ele rosnou para ela, mostrando os dentes.
Eveline não podia acreditar no que acabara de acontecer. Um desespero profundo e cortante a envolveu, como se tivesse sido atingida por uma lâmina afiada no coração. Era uma ferida que se abria dentro dela, deixando-a atordoada e sem chão.
Um uivo solitário ecoou na noite desesperançada de sua garganta, seu companheiro presenteado pela deusa Luna como uma promessa de amor e proteção, havia escolhido não acreditar nela. As palavras que ecoaram de seus lábios foram como punhais afiados, rasgando sua confiança e amor. Era como se a essência de seu ser tivesse sido negada, lançando sombras de dúvida e rejeição.
Eveline sentiu uma mistura devastadora de emoções. A dor era tão intensa que suas pernas pareciam fracas, incapazes de sustentá-la. Lágrimas silenciosas inundaram seus olhos, enquanto um vazio profundo e frio se instalava em seu peito.
Ela olhou ao redor e para o lugar onde cuidavam dos órfãos abandonados, o lugar que era seu refúgio, sua fonte de esperança e propósito. Mas agora, diante dessa rejeição avassaladora, ela se sentia incapaz de continuar. Seu coração partido a impedia de encontrar forças para cuidar dos outros, pois sua própria alma estava em pedaços.
Eveline não conseguiu cuidar de ninguém naquela noite. Ela sabia que ajudar os necessitados era o que mais importava para ela, os órfãos que ela tanto amava. Mas ela precisava enfrentar o luto pelo que havia perdido. Aquele companheiro que deveria ter sido seu âncora e apoio havia se tornado uma memória dolorosa. Ela precisava abrir espaço para sua dor, permitir-se sentir e curar as feridas causadas pela rejeição.
Assim, em meio à tristeza e ao pesar, sua loba assumiu o controle e correu pela floresta, afastando-se daquele lugar que antes era seu santuário. Em seu coração, a esperança lutava para sobreviver, enquanto a sombra da rejeição lançava sua escuridão sobre o caminho que se abria à frente.
Enquanto isso, Astrid havia tomado uma decisão. Ela não podia se casar com um príncipe sem prestígio, sabendo que seu pai a forçaria a fazê-lo. Recusando-se a casar, ela decidiu que fugir de casa era a única opção que poderia salvá-la desse casamento arranjado.